domingo, 18 de abril de 2021

CASINHA BRANCA À BEIRA DA ESTRADA


      Livros são trampolins para histórias diversas, sem fim. Com um salto, o leitor mergulha em universos paralelos; na velocidade do faz-de-conta cruza o mar dos piratas, viaja ao céu e ao país das fábulas, regressa aos tempos mitológicos sem se esquecer das cantigas de roda e da amarelinha. O leitor pisca: reina ao lado do saci; pisca de novo: visita as cortes de princesas encantadas; piscou-piscou: aprende que, para qualquer vivente falar feito gente grande, basta tomar as pílulas do doutor Caramujo.

         No mundo há um lugar onde bonecas, sabugos de milho e leitões têm títulos de nobreza; onde uma menina morena como o jambo e do narizinho arrebitado se casou com um príncipe peixe; e um valente menino, que só tem medo de vespas, se recusa a crescer tal como Peter Pan. Para este sítio correm os personagens da carochinha, das mil e uma noites, dos contos de Grimm e Perrault sedentos por novas aventuras. De trem ou charrete, a pé ou sorvendo pó de pirlimpimpim, na Hiena dos Mares ou no Pégaso, chega-se àquela casinha branca à beira da estrada. Onde, “na varanda, de cestinha de costura ao colo e óculos de ouro na ponta do nariz” vive “a mais feliz das vovós”. Nesse rincão encantado cortado por um riachinho (portal para o Reino das Águas Claras) há espaço para o sonho.

         O leitor, ao ouvir os serões da bondosa vovó ou os causos da mais prendada das cozinheiras, aprende a valorizar o poder do sonho. E sonhar, como certo alguém já o disse (e se não o disse, fica valendo como dito) é essencial ao viver. Assim é o Picapau Amarelo: parada obrigatória para a fantasia, a aventura, o sonho. Refúgio para todos que acreditam ser a vida um pisca-pisca. E, por isso, se recusam a abandonar o faz de conta.

      Os livros de Monteiro Lobato (1882-1948) mostram que não é preciso muito para ser feliz: basta ter imaginação. À luz do lampião, enquanto os grilos cricrilam lá fora e o cheiro de bolinho e pipoca espalha-se pela casa, sentado ao lado da Emília o leitor descobre o segredo da liberdade. E ser livre é ser feliz.

         No dia do nascimento de Lobato e dia nacional do livro infantil, a crônica de um menino que se sentou ao lado da Marquesa de Rabicó, tomou emprestada a cartola do Visconde e, do sítio, jamais saiu. 


Texto: Raphael Cerqueira Silva 

Foto: Museu Monteiro Lobato/Taubaté (fonte: Google imagens) 

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