— Sol ou chuva?
— Chuva e frio.
— Não pode, padrinho. Só sol ou só chuva.
— Só chuva.
— Mulher bonita?
— Sua mãe.
— Ih, o pai não vai gostar de ler isso...
— Ele vai ler?
— Uai, padrinho, é jornal que eu tô fazendo. Todo mundo vai ler.
— Todo mundo, quem?
— A tia da escola, a mãe, o pai, o vô. E todo mundo que parar pra ler as entrevistas coladas no mural da escola.
— Então, apaga. Escreve Yoná Magalhães.
— Quem?
— Uma atriz já falecida.
— Ô, padrinho, tem que ser gente viva... Posso botar o nome da madrinha?
— Não.
— Por quê?
— Tô brigado com ela.
— Por quê?
— Essa pergunta está na entrevista?
— Não.
— Avante!
— Como?
— Próxima pergunta, menino.
— O senhor ainda não disse o nome.
— Que nome?
— Da mulher bonita.
— Ah, bota aí Vera Fisher, Luíza Brunet, Maitê Proença... Qualquer nome serve.
— Padrinho, a entrevista é séria.
— Paola Oliveira, pronto.
— Homem charmoso?
— Uai, bonito não?
— A tia disse pra falar charmoso, se não os entrevistados não vão responder.
— Por quê?
— Porque homem não acha homem bonito, né.
— É... Escreve Cauã Reymond.
— Desenho animado?
— Papa-Léguas.
— Desenho velho não vale.
— Aquele que você fez na parede, então.
— Não fiz desenho animado, fiz arte. A tia mandou a gente imitar o Kobra.
— E por que não fizeram arte na parede dela?
— Porque ela mora longe.
— Ah, e os “artistas” não podem andar?
— Vou escrever o quê, hein?
— Ah, bota Pica-Pau.
— Cantor preferido?
— O rei Roberto Carlos.
— Posso colocar essa resposta na outra pergunta?
— Por quê?
— Porque a outra pergunta é: se você fosse morar num reino encantado, seria o reino de quem?
— Esse rei que falei é rei da música, não de um reino...
— Ih, padrinho, não complica. É papo reto, sacou?
— Como?
— Super-herói preferido?
— Superhomem.
— Ô, padrinho, é Superman. Mania de velho falar errado. Livro preferido?
— Não sou muito de ler, não.
— Fala qualquer um, menos a Bíblia.
— Por quê?
— Porque todos os entrevistados responderam esse.
— Quem você já entrevistou?
— Não digo.
— Ora, por quê?
— Porque um repórter guarda o segredo das fontes.
— Quem te disse isso, menino?
— A tia da escola.
— Essa tia não tem nada melhor pra ensinar, não?
— Por quê?
— No meu tempo, a gente tinha tarefa de aritmética, fazia conta no ábaco, decorava as capitais, copiava texto no caderno brochurão...
— O velho de novo.
— Olha aqui, seu moleque...
— Calma, padrinho, é só o nome dum livro que lembrei agora.
— Quem escreveu essa marmota?
— Pedro Paulo Pereira do Prado Penteado.
— Por isso não gosto de ler.
— Artista?
— Pintor, escultor, compositor?
— Qualquer um.
— Da Vinci.
— Vinte, não. É um nome só.
— Leonardo da Vinci.
— Ator preferido?
— Vivo ou morto?
— Vivo, padrinho, vivo. Se não ninguém da escola vai saber quem é.
— Tony Ramos.
— É estrangeiro?
— Não.
— Quero estrangeiro.
— Por quê?
— Porque é chique escrever nome estrangeiro.
— E você sabe escrever estrangeiro?
— E-s-t-r-a-n... hum, é com g ou j?
— Te peguei. Eu quis dizer escrever o nome do ator estrangeiro.
— O padrinho também tem dúvida?
— Arnold Schwarzenegger.
— Não... Estrangeiro é com g ou j?
— Próxima pergunta, vai.
— Não sabe, não sabe.
— Isso é trabalho de Português, por acaso?
— Já foi em Portugal?
— Não, por quê?
— Tem uma pergunta aqui que é: qual país já visitou?
— Paraguai.
— Foi fazer o quê lá?
— A tia quer saber isso também?
— O repórter vai além da pauta do editor.
— Sei... Essa entrevista não tem fim?
— Tem, tá acabando. Foi fazer o quê, lá?
— Lá onde, menino?
— No Paraguai.
— Fui comprar cigarro, aparelho de som, televisão e videocassete.
— Video o quê?
— Um aparelho que a gente usava pra ver filme.
— Não tinha dessas coisas aqui na cidade?
— Eu revendia no consórcio.
— Como assim?
— Próxima pergunta.
— Atriz preferida?
— Julia Roberts.
— Pode ser brasileira mesmo.
— Ô, menino, decide.
— Escritor?
— Paulo Coelho.
— O padrinho já leu ele?
— Não, mas minha filha vive lendo.
— Música preferida?
— Tente outra vez.
— É sério, padrinho. Música?
— Falando sério.
— Ô, mãe, o padrinho tá me trolando!
— Vamo embora, filho.
— Falta só uma pergunta, mãe.
— Anda, seu padrinho quer ver a novela.
— Se um ET descesse no quintal e dissesse: faça-me um pedido, o que você pediria?
— Que levasse todos os meninos perguntadores pro espaço.
— Ô, mãe, o padrinho tá copiando a resposta do vô!
Adorei!
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