Ontem, assisti na Netflix “A máscara do Zorro”. Lembro-me bem de quando assisti a esse filme pela primeira vez: era ainda o tempo das fitas de videocassete que se alugava por um fim de semana. No longa, Don Diego de la Vega (Anthony Hopkins) retorna da prisão para vingar a morte da esposa e resgatar a filha; velho e sem a agilidade de outrora, Don Diego precisa recrutar um rapaz para assumir seu lugar como Zorro; por ironia do destino, o ladrão Alejandro (Antonio Banderas) cruza seu caminho, assume a capa e a máscara tornando-se, assim, o espadachim mais famoso da Califórnia espanhola.
Mas esta crônica não é para falar do filme não. É para falar das reminiscências que me assaltaram enquanto as cenas se desenrolavam no meu televisor. Lembrei-me das manhãs de domingo quando eu via o Zorro na tevê... Não era esse Zorro de Hopkins/Banderas, era outro, mais antigo; o Zorro que eu via era interpretado por Guy Williams, e sempre deixava o enrolado Sargento Garcia fulo da vida.
Ah, saudosa época. Tempos de grandes heróis, de inesquecíveis aventuras, de puerilidades e encantamentos. Naquelas manhãs ensolaradas, sonhei cavalgar também meu Tornado, trajar capa, máscara e chapéu negros como a noite, salvar belas donzelas, destruir os planos dos ricos e poderosos. Nas tardes igualmente ensolaradas, empunhando minha espadinha de plástico (que, embora tivesse o olho de Thundera adesivado, podia se tornar a espada do Zorro, do He-man e até do Jaspion, afinal, não havia freios à imaginação) eu era destemido, valente, guerreiro, podia tudo.
Não só o herói californiano fazia minha cabeça. Tantas vezes me vi, como o Fantasma, a correr pelas savanas em meio a ferozes animais; a voar ligeiro pelo espaço ao lado do Flash Gordon; me envolvi em tantas enrascadas junto com o Inspetor Bugiganga... Lembro-me agora de uma tarde de carnaval, matinê na Scipião Rocha, eu todo empolgado com minha fantasia de Super-Homem... Mas essa recordação deixo, por ora, em suspenso, só no campo da recordação mesmo: é um tanto quanto triste, diria quase traumática, não quero escrever sobre ela, não hoje.
Mudando de pato pra ganso, mas ainda falando em personagens que me fascinaram, Zé Carioca é o aniversariante da semana. Palmas para o mais famoso papagaio da Vila Xurupita e dos quadrinhos, que completou oitenta primaveras. Esse, sim, me arrancou boas risadas durante anos com seu jeitão preguiçoso e malandro. Naqueles já longínquos anos 1990, as revistas do Zé Carioca chegavam para mim pelo correio, vinham num pacote verde-musgo, junto com outras revistinhas do universo Disney. Deitado na cama ou largado no sofá, eu devorava aquelas aventuras... oh, como temi que ele fosse capturado pelos cobradores da ANACOZECA, que perdesse o amor da Rosinha para o antipático Zé Galo, que virasse ração na bocarra do feroz Átila. Naquele tempo, as revistinhas do Zé eram quinzenais; hoje, infelizmente, não chega uma sequer nas bancas... aliás, praticamente se extinguiram também as bancas.
Cazuza disse num verso que seus heróis morreram de overdose. Os meus heróis, ao contrário, não morreram; estão vivíssimos aqui dentro de mim, embora estejam sumidos da televisão e dos quadrinhos. O tempo, num roldão, levou heróis e fantasias, capas e espadas para longe, nos deixando reféns de falsos mitos e profetas hipócritas, à mercê de corruptos e falácias, errantes entre torpezas e imposturas... Ah, se eu pudesse voltar no tempo, regressaria àquelas manhãs ensolaradas de domingo.
E agora vou encerrar essa lengalenga nostálgica porque tem um monte de espinafre me esperando no almoço. Quem sabe comendo espinafre eu consiga resolver os meus problemas como o Popeye fazia.
Texto: Raphael Cerqueira Silva
Foto: acervo do autor
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